O anúncio dos lucros obtidos pela
elétrica regional EDA têm sido motivo de discussão pública, não tanto pelo
montante – cerca de oito milhões de Euros – mas sobretudo pela decisão de
distribuir estes dividendos pelos respetivos acionistas. Não discuto a
legitimidade da decisão sobre o destino a dar a este dinheiro. Nem tão pouco
opino sobre outras possíveis aplicações deste montante. Mas não quero deixar de
registar e manifestar a minha apreensão sobre o que li, na imprensa regional e
em alguma nacional, sobre a ideia peregrina de que este lucro da EDA deveria
ser utilizado para reduzir as tarifas da energia elétrica que os açorianos
pagam e não para serem distribuídos pelos acionistas da empresa. Devo alertar
para o perigo desta opinião. Esta proposta a ser concretizada seria um autêntico
tiro no pé. Ou como diria o antigo jogador e treinador de futebol Jaime
Pacheco, uma faca de dois “legumes”.
O fornecimento de energia elétrica é um
serviço público essencial devendo ser assegurado à generalidade dos
consumidores nacionais em condições de igualdade. Para garantir a defesa do
consumidor, são impostas obrigações de serviço público onde e quando, por si
só, a concorrência não possa assegurar tal fim. Uma componente fundamental na
prestação deste serviço público, o tarifário, não é independente do local de
residência dos consumidores. Nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira o
custo inerente à disponibilização da energia elétrica é consideravelmente superior
ao do continente donde resulta uma clara assimetria com consequente penalização
para os cidadãos e agentes económicos residentes nestas regiões. Até 2002 a
competência para fixação dos preços da eletricidade era dos Governos Regionais,
tendo sido, em 2003, transferida para a ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços
Energéticos – pelo Decreto-Lei nº 69/2002 de 25 de março, no âmbito do processo
de convergência nacional do tarifário elétrico. Este novo modelo determinou que
as competências da ERSE fossem estendidas aos respetivos territórios insulares
passando as empresas de eletricidade dos Açores e da Madeira a estar sujeitas
ao mesmo tipo de controlo e regulação que as congéneres do continente. O
sobrecusto da insularidade passou a ser suportado no quadro do tarifário
nacional, à semelhança do que sucede em outros países da União Europeia com
especificidades geográficas e administrativas semelhantes e no pressuposto de
igualdade e coesão subjacente a todo o processo. Resumidamente, açorianos e
madeirenses pagam as mesmas tarifas dos continentais, em mercado regulado,
sendo os custos de produção, eles próprios assimétricos entre as nossas nove
ilhas, superiores ao preço de venda ao cliente final. Se na nossa região fossem
fixados preços mais baixos para a energia elétrica do que os fixados pela ERSE
seria o mesmo que dizer: não queremos o valor total da compensação que
recebemos do continente e as contas da ERSE estão mal feitas! Note-se que a
ERSE está obrigada pela lei, a garantir o equilíbrio económico-financeiro das
empresas reguladas (EDA incluída) e calcula a respetiva compensação pela
diferença entre o que considera os custos eficientes (inferiores aos reais) e a
receita obtida pelas vendas aos preços por ela fixados, já com a preocupação da
compensação ser a menor possível.
Neste quadro, seria conveniente deixar
tudo como está uma vez que os benefícios para os açorianos são evidentes com o
atual regime de regulação e convergência do tarifário em vigor. Caso este não
existisse, as tarifas por nós pagas seriam o dobro, no mínimo.
Tal como em muitos outros domínios, no
setor da energia também há facas de dois “legumes” e devemos ter condições para
acreditar que quem com elas corta escolhe sempre o lado certo.
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