Como é habitual e cumprindo a legislação
em vigor, a ERSE – Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos – apresentou no
passado dia quinze, o mesmo dia da entrega do Orçamento do Estado (o do nosso descontentamento)
para 2014, a proposta de tarifas e preços para a energia elétrica a vigorar no
próximo ano. O ano de 2014 será o segundo ano de plena vigência do mercado
liberalizado de eletricidade, no sentido das tarifas reguladas remanescentes
serem já exclusivamente de natureza transitória. O mercado elétrico liberalizado
atingiu em agosto de 2013 quase 2 milhões de clientes e representa já 69,1% do
consumo total em Portugal, tendo as tarifas transitórias cada vez menor
expressão no setor. Quem permanece e permanecerá no mercado regulado, não se
aplicando este regime transitório, são os cerca de 120.000 consumidores
açorianos não abrangidos pelo mercado concorrencial liberalizado do continente.
É simples perceber porquê: a EDA detém o monopólio da comercialização de
energia elétrica na região e não se adivinha a entrada no mercado de outros
operadores em regime de concorrência. Não é um mercado atrativo e muito menos
sustentável.
A proposta de tarifas por agora
apresentada impacta diretamente nos consumidores açorianos e estabelece um
aumento de 2,8% ao qual deveremos adicionar o aumento do IVA por redução do
diferencial fiscal imposto pela Lei das Finanças Regionais.
Dos vários fatores que pressionam em alta
as tarifas da eletricidade, destaco dois: a redução do consumo e o aumento
excecional da chamada produção em regime especial que como é do domínio público
tem beneficiado de um conjunto de incentivos económicos que muito tem
contribuído para o agravamento do défice tarifário, o qual estamos a pagar nas
nossas faturas através das tarifas de acesso às redes. A energia produzida ao
abrigo destes contratos garante aos produtores uma tarifa mais alta e a
prioridade no escoamento da energia produzida, seja ela absorvida pelos
consumidores ou não. Se considerarmos as condições meteorológicas excecionais
(vento e chuva) que se verificaram em Portugal no primeiro semestre de 2013 e
que motivaram um aumento de 30% da produção em regime especial e se, do outro
lado, considerarmos a redução do consumo, facilmente se compreende como um
menor consumo pode originar uma pressão sobre as tarifas no sentido do seu
aumento. Ou seja, a energia produzida e paga ao consumidor com uma tarifa mais
elevada entrou toda na rede mas não foi consumida em Portugal. Foi “oferecida”
aos nossos vizinhos espanhóis e ficamos nós a pagar a oferenda. Agora aqueles
que criticaram o ex-Ministro das Finanças quando este afirmou que as condições
climatéricas tinham impacto na economia devem, afinal, dar-lhe razão.
A produção em regime especial prevista
para 2014 totaliza a módica quantia de 1800 milhões de Euros estando estimada
uma amortização de apenas 355 milhões de Euros. Este fator continuará, assim, a
“engordar” a dívida tarifária apesar de todas as medidas mitigadoras, na sua
maioria políticas, que limitaram o aumento das tarifas para 2014 que, segundo o
governo, seriam de 14% caso não tivessem sido tomadas. Essas medidas resumem-se
a continuar a diluir no tempo a liquidação do défice tarifário com a agravante
dos juros (155 milhões de Euros no próximo ano).
Paralelamente, o Orçamento do Estado para
o próximo ano prevê a aplicação da CESE – contribuição extraordinária do setor
energético, no valor de 150 milhões de Euros sendo que 50 milhões se destinarão
a abater diretamente o défice tarifário e (ainda) as medidas de eficiência
energética(?). Uma autêntica ninharia face aos mais de 4000 milhões de euros da
dívida do tarifário. Mas como, tal como para quem tem fome, um naco de pão é
refeição de rei, para ao nosso governo qualquer milhãozinho é um banquete. Na
verdade, o estado não pode, apesar de o fazer descaradamente, garantir que esta
taxa não será refletida nas tarifas, até porque uma parte significativa do
mercado já está liberalizado. É apenas mais do mesmo. Até quando?
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