domingo, 24 de novembro de 2013

LIÇÕES DE UMA VIAGEM EM BALÃO


Bertrand Piccard é um psiquiatra e balonista suíço que em 1999 completou a primeira volta ao mundo em balão, sem escalas, acompanhado pelo inglês Brian Jones. A bordo do Breitling Orbiter 3, iniciaram o percurso na Suíça e voaram 45755 km até ao fim da sua viagem no Egito, 19 dias 21 horas e 47 minutos depois.
Durante a sua viagem, numa certa madrugada, Piccard tirou uma fotografia à janela do seu balão coberta com uma camada de gelo criada pela humidade da noite. Através da camada gelada podia ver-se o nascer do sol que, na visão metafórica do suíço representa o desconhecido. Piccard compara esta imagem ao que classifica como o grande problema das nossas sociedades: o medo de enfrentar o que nunca foi visto, o que não é óbvio para quem não se atreve a atravessar o gelo para ver o que está do outro lado. Bertrand Picaard descreve um pioneiro ou empreendedor não como alguém que tem ideias novas mas sim aquele que se liberta de hábitos, certezas, convicções, pontos de exclamação, preconceitos, paradigmas e dogmas, permitindo-se atravessar o gelo abrindo múltiplas linhas direcionais na sua vida. E isto pode aplicar-se à política, às finanças, à educação, ao ambiente. Piccard acredita que o mundo pode ser melhor se a política se libertar das trincheiras da esquerda e da direita porque assim nos libertamos desses dogmas, que podemos fazer muito mais pelo ambiente se afastarmos o “fundamentalismo verde” que alguns têm demonstrado no passado, que podemos melhorar o nosso espiritualismo se nos libertarmos de preconceitos religiosos.
Quando se viaja num balão por vezes torna-se difícil perceber a que altitude se pode voar, desconhecem-se as direções das camadas vento. Por isso é fundamental o apoio dos “homens do tempo”, como descreve Piccard. E conta-nos um episódio desta viajem de circum-navegação. Certo dia o seu “homem do tempo” mandou-os voar muito baixo e muito devagar. Ao refazer os seus cálculos com Jones, concluíram que não chegariam ao seu destino àquela velocidade. Resolveram voar, então, mais alto e a maior velocidade comunicando essa decisão ao seu meteorologista que de imediato lhes ordenou que descessem rapidamente de altitude para voarem mais lentamente. Piccard negou-se a fazê-lo afirmando que não tinham gás suficiente para voar tão baixo e tão devagar. O meteorologista afirmou que com as baixas pressões que tinham à sua esquerda, dali a duas horas mudariam de trajetória e acabariam no Pólo Norte! E questionou Piccard sobre se ele preferia voar rápido na direção errada ou voar mais devagar na direção certa. Foi então que decidiram descer de altitude e alterar completamente a estratégia de voo mesmo sabendo que o sensor de combustível os ameaçava quando atravessaram o Pacífico. Nesta altura perceberam que não havia volta possível. E o medo, a crise, instalou-se nos seus pensamentos. Alguns dias depois aterraram no destino final apenas com 40 dos 3700 kg de gás propano com que iniciaram o percurso.
A experiência narrada por Piccard e Jones a bordo do seu balão traz-nos várias lições. Uma delas é, inequivocamente, que a mudança está ao alcance de qualquer um, saibamos nós interpretar e aceitar os sinais e alertas à nossa volta.
Na política, na religião, na economia, na educação, na energia, em todos os setores que possamos imaginar e até mesmo nas nossas vidas individuais, a mensagem destes dois aventureiros parece clara e evidente.
Não vale a pena insistir em políticas, modelos, métodos, teorias, experiência ou receitas, quando todos os sinais indicam o descalabro, a insustentabilidade e a miséria. 
Decisores dos mais variados quadrantes da sociedade devem saber quebrar o gelo e vislumbrar o que está do outro lado. Sem medo do desconhecido e do não óbvio. Abrir novas linhas de pensamento e saber ler os sinais que os rodeiam, afastando dogmas e preconceitos, interesses e compadrios como quem larga lastro numa viagem de balão. Assim se vencem crises. Assim se atingem objetivos. Assim se consegue a sustentabilidade em qualquer domínio. Assim se revelam os verdadeiros pioneiros e empreendedores. Assim se salvam nações.